Continuação da história
... um dia, os homens puseram-se estranhamente a comprar palavras cinzentas. Havia uma crise de emprego, uma greve de corações. Os patrões compravam muitos:
Vá pregar a outra freguesia;
Está bem arranjado, homem;
Obrigado pelos seus serviços mas está despedido.
Havia guerras entre famílias, divórcios, casais que já não se entendiam. Invejas entre irmãos, zangas… Comprava-se vários:
Já não gosto de ti;
Acabou tudo.
Nas lojas de palavras cor-de-rosa, muitos:
Obrigado;
Por favor;
Gosto de ti , ficavam por vender.
— Para o diabo com as palavras doces — diziam os homens. — São caras e não trazem nenhum benefício.
Os vendedores de palavras cor-de-rosa, desolados, já não sabiam onde as armazenar.
As lojas cor-de-rosa fechavam umas atrás das outras.
Passa-se;
Fechado por morte do proprietário;
Liquidação total;
Quinze palavras cor-de-rosa pelo preço de uma.
Mas, mesmo a preços módicos, elas não atraíam ninguém. As lojas de palavras cinzentas, essas sim, prosperavam. Porque, e isso é bem conhecido, as palavras feias são contagiosas. Se no recreio te lembrares de lançar uma, receberás dez em troca! Abriram-se mesmo lojas especializadas em palavras feias, risos grosseiros, insultos horríveis. E os vendedores cinzentos trabalhavam dia e noite para descobrirem jóias raras, as palavras mais horríveis e mais maldosas!
Como receavam ficar sem provisões, como costuma acontecer em tempo de guerra, as pessoas começaram a fazer conservas de palavras cinzentas. Congelaram-nas às dúzias, empilharam-nas nos armários da cozinha, nos guarda-fatos, debaixo das camas.
E, upa, ao menor atrito, ao mais pequeno gracejo, à mais insignificante discussão, ...
Amanhã há mais...
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